Alcides Fonseca

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O movimento 8% está a focar-se nas coisas erradas.

Foram publicados os resultados do CEEC 2018, onde apenas 8% dos candidatos conseguiram um contrato de 6 anos.

O Movimento 8% quer denunciar a precariedade na Ciência nacional e bem, até porque infelizmente ela é bem real. A existência de bolsas desrespeita os direitos de quem vive à custa delas (como eu já vivi) e considero até ilegal.

Mas o Movimento 8% está a usar or argumentos errados. Estão a basear a sua campanha em fotografias onde os sortudos que viram os seus contratos de 6 anos aceite estão a branco e o que não tiveram essa sorte a preto. Usar estas fotografias como meio de denúncia é enganador e inútil.

Em primeiro lugar, não ter ganho um contrato nesta call não quer dizer que não tenham um contrato de outra natureza para fazer Ciência. Posso dizer que no meu centro de investigação, todos os candidatos que não foram selecionados têm ou um contrato de post-doc associado a projectos de investigação, ou estão já integrados na carreira docente, onde não necessitam de se preocupar no que fazer quando acabarem os 6 anos.

É nisto que o Movimento 8% (com outro nome) se deveria focar: exceptuando poucos casos (humanidades e eventualmente matemática) é impossível fazer investigação sem ter financiamento para equipamentos, alunos, colaboradores, viagens a conferências, etc… Os investigadores FCT 2013 tinham até 50K€ para estes fins. Esses contratos não só pagavam o investigador, como financiavam alguns custos adicionais de forma a que fosse possível cumprir o plano de trabalhos.

E o movimento devia também focar-se em que não faz sentido dar contratos de 6 anos a pessoas que nas categorias de Investigador Principal e Coordenador estão no topo da sua carreira. Como exemplo, Maria Manuel Mota e Irene Pimentel foram deixadas de parte o ano passado. Nem as duas recipientes do prémio Pessoa, nem as respectivas instituições deveriam ficar satisfeitas com contratos de 6 anos. Investigadores Séniores não deviam sequer ter de se candidatar a estes concursos. Deviam ter um contrato com a instituição de acolhimento, com financiamento estrutural garantido pelo estado, tal como na carreira de docente o estado garante o financiamento dos professores.

E o que acontece quando o projecto que financia outros custos acabar, e o investigador só tiver o seu ordenado como garantido? Deixa de poder fazer investigação, mas tem emprego? Não faz sentido. Em vez do governo se preocupar em dar emprego a doutorados, devia-se focar em dinamizar a Ciência e dar condições para se realizarem projectos. E uma dessas condições é ter uma carreira em pé de igualdade com a carreira docente.

Agora gastar esforço a mostrar que um concurso que promove a precariedade teve uma taxa de aceitação de 8% é enganador para o público que não está por dentro disto, e mostra que os investigadores queriam esses contratos precários em vez de uma carreira a sério.